domingo, 3 de julho de 2022

Monoteísmo: a praga do homem






Filho do Sol

Nos dias antigos de Khem
Um Faraó estava louvando
O Sol sobre Amon
Osíris, Mãe Isis e Toth

Os deuses puniriam o sacrilégio do Faraó
Ele se abrigou no falso nascer do Sol
Ele foi o fundador do único Deus
Mas ele provocou um ataque de ira

Filho do Sol, esse era seu nome
Filho do Sol, o Sol queimará as suas asas
Filho do Sol, cuidado com Aton
Filho do Sol, seu Deus te deixará

A esfinge caiu em lágrimas
E pirâmides tremem
O precipício se aproxima
Enquanto o Faraó perde sua fé

Alucinações desencaminharam o Faraó
Os presságios eram muito agourentos
Até hoje sua maldição é a praga do homem
Devemos derrotar o único Deus!

Filho do Sol, esse era seu nome
Filho do Sol, o Sol queimará as suas asas
Filho do Sol, cuidado com Aton
Filho do Sol, seu Deus te deixará

Apep ascenderá
Apep virá

Filho do Sol, esse era seu nome
Filho do Sol, o Sol queimará as suas asas
Filho do Sol, cuidado com Aton
Filho do Sol, seu Deus te deixará

-------------------------

Akhenaton era filho do faraó Amenhotep III, um dos mais poderosos e populares governantes da décima-oitava dinastia egípcia. Quando o pai morreu, Akhenaton subiu ao trono como Amenhotep IV. Casou-se com Nefertiti e com ela teve seis filhas.
Por toda sua história, o povo Egípcio adorara muitos deuses, entre eles o deus-sol, Aton. Amenhotep declarou que acreditava ser Aton o único deus todo-poderoso do universo e que todas as pessoas deveriam adorar somente ele. O faraó adotou o nome Akhenaton (Aquele que é útil a Aton) e transferiu a capital do Egito de Tebas para Akhetaton ("Horizonte de Aton"), cidade que construiu à margem oriental do rio Nilo. Hoje, o lugar é conhecido como El-Amarna. Akhenaton e Nefertiti governaram uma corte que adorava apenas Aton. Os nomes dos outros deuses foram excluídos das esculturas de pedra da residência imperial e Akhenaton exigiu que seus empregados e cortesãos seguissem suas crenças. Akhenaton e seus seguidores também construíram novos prédios e costumavam fazer cerimônias complexas em seus novos templos e palácios. A nova capital conquistou riquezas e esse foi o início do chamado período Amarna das artes egípcias. As esculturas se tornaram mais realistas e vívidas; as pinturas mostravam um faraó de aparência estranha com um pescoço muito longo e coxas enormes, ele e a família eram representados em cenas informais e até divertidas. Sua mãe, que viveu durante os seis primeiros anos de seu reinado, foi responsável pela estruturação das tendências místicas, fazendo com que ele se aproximasse da parte do clero que estava ligada aos antigos cultos do Egito, onde Aton era o deus maior.
Assim, durante os quatro primeiros anos de seu reinado, vai lentamente, se afastando de Tebas e amadurecendo a idéia de um deus universal. Ao final deste período, ele inicia a grande revolução. Proclama sua intenção de realizar a cerimônia religiosa de regeneração denominada "festa-sed" na qual o faraó "se recarrega". [Além disto, o poder dos sacerdotes de Amon vinha crescendo e eles, pouco a pouco, ficavam mais influentes. Portanto, além da piedade do faraó, havia também motivações politicas.] No entanto, muitos alto-sacerdotes egípcios se ofenderam e se sentiram ameaçados pela adoração a um só deus que praticava o faraó. Quando os seguidores de Akhenaton começaram a destruir as estátuas e locais de adoração dos outros deuses egípcios, muitos egípcios também se enfureceram. Quando morreu, por volta de 1335 a.C., Akhenaton já tinha se tornado muito impopular.
O trono passou imediatamente a seu jovem genro, Tutankhaten, que recebeu o nome de Tutancâmon. Sob seu reinado, a capital voltou a Tebas; o deus-sol Aton foi retirado de muitos obeliscos do Egito e o povo voltou a ser politeísta, ou seja, a adorar diversos deuses. Por fim, os sucessores de Akhenaton destruíram praticamente tudo que ele havia construído em sua nova cidade, apagando quase todas as indicações de seu reinado. O conhecimento desse período da história do Egito vem das escavações realizadas em El-Amarna entre 1887 e 1934. Um dos momentos mais importantes da arqueologia moderna aconteceu em 1922, quando o túmulo de Tutancâmon foi descoberto. Com isso, arqueólogos e historiadores de arte encontraram meios para entender o legado de Akhenaton e sua família Na mitologia egípcia, Apep (ou Apophis, em grego. Também conhecida como Apófis), é uma criatura em forma de serpente que combatia o deus Rá ao cair de cada noite, sendo sempre morta, mas sempre ressuscitando. Também chamada de Apepi ou Aapep.
Apep é a personificação do caos no submundo e um inimigo jurado dos deuses (principalmente Rá). Ele é a personificação do próprio caos, destruição e do mal na mitologia Faraônica (Egípcia). Apep surge como uma serpente gigantesca, com 30m de comprimento. É servido por hordas de demônios, a maioria possuindo qualidades de serpente do fogo. Para os egípcios, quando havia um Eclipse, era o corpo gigantesco de Apep, cobrindo a luz do Sol, enquanto tentava destruir a barca de Rá e devorá-lo. Apep se encontrava no ultimo dos 12 portões do Submundo, onde era o maior desafio de Rá.

------------------

A banda de Metal Sinfônico Therion possui uma canção sobre o Filho do Sol, Akhenaton (reinou de 1353 a 1334 antes de Cristo). Faz uma crítica à forma autoritária com que ele impôs o Monoteísmo (há divergências sobre se o Atenismo foi de fato Monoteísta ou Henoteísta, Monolatrista ou uma forma de sincretismo, mas a tendência da Academia é considerar Monoteísmo).

Akhenaton fez grandes obras públicas e melhoramentos, construiu uma nova capital e a chamou de Akhetaton (depois conhecida como Amarna). Sua concepção religiosa pode ser considerada Panenteísta. Ele tinha consciência de que os vários Deuses eram na verdade um só e gostou muito de usar o Sol como símbolo para essa Única Divindade.

O Deus do Sol, sob vários nomes e em várias mitologias diferentes, vinha sendo adorado com mais afinco no Egito e estava ficando popular. Akhenaton se deixou influenciar por essa protuberância de culto a um único Deus. O problema é que sua concepção é essencialmente Monoteísta e ele não aceitou a adoração de outros deuses, destruindo cultos e impondo a adoração exclusiva a Aton. Resultado: após a sua morte todas as suas mudanças religiosas foram desfeitas e ele foi retirado das listas dos Faraós, passando a ser conhecido como fanático, insano e louco.

Akhenaton não soube esclarecer e refinar o Politeísmo egípcio. Ele não entendia realmente o Panenteísmo e acabou desembocando num Monoteísmo. Isso irritou os sacerdotes e sumo-sacerdotes dos vários deuses egípcios e nem os Faraós posteriores seguiram Akhenaton mas apoiaram e financiaram todas as contra-reformas que apagaram o Atenismo do Egito.

Obs: o Panenteísmo só existe plenamente no Hinduísmo, Taoísmo, parte do Budismo Mahayana, do Budismo Tibetano e nas religiões Gnósticas sobreviventes (Mandeísmo, Maniqueísmo/Monijiao, Religiões Salvacionistas Chinesas, Yungdrung Bon, Sufismo, Cabalá judaica e Cristianismo Esotérico).

O Monoteísmo não sobreviveu no Egito. Mas um outro reformador, Zoroastro, em terras persas, fez o Monoteísmo se tornar religião oficial de Estado de maneira duradoura. No começo das conquistas do Império Medo-Persa, o Zoroastrismo era tolerante. Mas séculos depois, na dinastia Sassânida, o Monoteísmo Zoroastriano se tornou fanático e intolerante. Esse espírito fanático contaminou Judaísmo, Cristianismo e Islamismo.

O Monoteísmo tende ao Autoritarismo. Por quê?

Na minha opinião é porque a estrutura da crença Monoteísta NÃO ACEITA O OUTRO, NÃO ACEITA A ALTERIDADE. Para entender isso acho muito oportuno ler e conhecer a obra do filósofo Emmanuel Levinas, que criou a chamada Filosofia da Alteridade. Eu li pouco de seus escritos estudando Filosofia mas esse pouco já serviu muito. Encontrei um texto na internet que resume e sintetiza muito bem a filosofia de Levinas, por isso postarei na íntegra esse texto e farei comentários :

---------------

Emmanuel Lévinas: Introdução à Filosofia da Alteridade

Emmanuel Lévinas - Filosofia da Alteridade

O filósofo lituano-francês Emmanuel Lévinas (1906-1995) é considerado um dos mais influentes pensadores éticos do século XX. Desenvolveu uma filosofia baseada na ideia de Alteridade. Segundo Lévinas, quando o outro é percebido como Alteridade torna-se absolutamente Outro, incompreensível, transcendente e incontornável, fonte das grandes experiências de vida e base genuína da ética.

Para desenvolver sua argumentação, Lévinas criou termos (chamados de categorias levinasianas) que aqui serão identificados com inicial maiúscula, como Alteridade, Infinito, Totalidade, Outro, Rosto e Mesmo. Esses conceitos se relacionam de forma a demonstrar as falhas da filosofia ocidental e propor uma nova visão ética.

Alteridade, Outro e Mesmo


Lévinas pretende romper com a ética da filosofia ocidental, que, segundo o filósofo, desconsidera a Alteridade do Outro. Para a mentalidade ocidental o Outro é aceito apenas se convertido e reduzido ao “eu“: minha cultura, religião, ideologia, filosofia ou visão de mundo.

Tal perspectiva reducionista define a própria existência a partir do “ser” (que surge com Parmênides: “O ser é, o não-ser não é”) e do “eu” ou ego cogito (“Penso, logo existo” de Descartes). Segundo Lévinas, essas são as bases filosóficas do pensamento ocidental que constituem a realidade apenas a partir de si mesmas.

A filosofia busca totalizar todas as coisas, ter uma síntese total da existência, inclusive do eu individual, deixando-nos “lado a lado” e não “face a face”. (HUTCHENS, 2007)

Fundamentada nessas bases, a ética ocidental (e a própria filosofia) justifica a guerra e a violência contra o Outro, uma vez que o Outro torna-se ameaça à visão de mundo reduzida e egocêntrica.

O Outro, estando além do “eu” (ou do Mesmo), é entendido como nada, não-humano ou inexistente, portanto, pode sofrer violência ou ser eliminado sem prejuízo à consciência, afinal, resistiu à “verdade”, sendo culpado de seu sofrimento.

Totalidade, Infinito e Rosto


A forma de ver o mundo a partir de si mesmo, negando a Alteridade do Outro, é chamada por Lévinas de pensamento totalizante ou Totalidade. Contudo, é impossível viver fora da Totalidade (a identidade que formou meu ser). Por outro lado, a Totalidade não pode ser base para a ética ou a relação com o Outro.

A face do ser que se mostra na guerra fixa-se no conceito de totalidade que domina a filosofia ocidental. Os indivíduos reduzem-se aí a portadores de formas que os comandam sem eles saberem. Os indivíduos vão buscar na totalidade o seu sentido (invisível fora dela).” (LEVINAS, 2008, p.8)

O que Lévinas propõe é uma nova relação entre Totalidade e Alteridade que não seja excludente e destrutiva, mas de aceitação mútua.

Lévinas entende que as relações éticas são transcendentais, estariam além da possibilidade de apreensão do “eu” e do “ser”. Contudo, é importante frisar que “transcendental” não tem sentido divino ou sobrenatural, mas sim de algo “além de mim” e, portanto, ainda assim inatingível.

Desta forma, a ética em Lévinas assume caráter sagrado, pois sendo o Outro transcendente, as relações com o Outro equivalem à relação com Deus ou com o Infinito, algo além de minha capacidade de apreensão.

Se o sofrimento do Outro não me afeta, é porque ele está reduzido à Totalidade, fato que me impede de ver seu Rosto. O Outro é sempre estrangeiro para mim, ainda que seja irmão, vizinho ou viajante. Mas a visão do Rosto, quando acontece, sempre surpreende, pois é visão do Outro nunca antes percebida que rompe minha Totalidade e minha ingenuidade. Deixamos de ficar “lado a lado” e ficamos “face a face”Rosto é um conceito de Lévinas que sintetiza sua ética e possui uma complexidade que não pode ser abordada em um texto introdutório.

Por isso o nome da principal obra de Lévinas é Totalidade e Infinito, pois a relação ética é sempre relação do “eu” (Totalidade) com algo irredutível ao pensamento (Infinito).

Querer reduzir o Outro ao pensamento é querer, com minha Totalidade, abarcar o Infinito. Mas isso, obviamente, é impossível. Se acredito que conheço o Outro, isso é apenas ilusão egoísta da Totalidade. A visão do Rosto, que é vestígio de Infinito, é a súbita percepção disso.

A ética da Alteridade


A relação ética genuína ocorre quando a Alteridade é preservada sem, contudo, deixar de acolher o Outro em sua fragilidade e necessidade. É uma relação de passagem e aceitação, não de concordância, posse ou identidade, pois o “eu” será sempre o Mesmo e o outro será sempre o Outro.

Essa insistência de Lévinas no Outro como Alteridade (e consequentemente como Infinito) busca transportar para a ética uma das mais antigas experiências humanas: a experiência com o sagrado.

Não se trata da experiência das religiões, principalmente quando dogmáticas, pois apenas reduzem o Outro ao Mesmo. Trata-se das autênticas experiências com a Alteridade, quando há assombro e súbita percepção de algo além de qualquer tentativa de posse ou redução.

Essa é a experiência que Lévinas chama de epifania do Rosto, e marca claramente a fronteira entre religião (que é relação com o Mesmo) e religiosidade (relação com o Infinito), pois rompe a ingenuidade.

A violência é uma das chaves para o entendimento da ética da Alteridade de Lévinas, pois a redução do Outro ao Mesmo sempre gera algum tipo de violência que parte daquele que recusa ou reduz Alteridade.

Ainda que a filosofia de Emmanuel Lévinas pareça religiosa, o filósofo pretende com isso demonstrar uma metafísica positiva de aceitação do Outro — uma ética da Alteridade. Evita, assim, a metafísica negativa (ética excludente da teologia, filosofia e política ocidentais), pois, nesses casos, a única certeza clara, nas palavras de Lévinas, é “a certeza da paz que traz a evidência da guerra”.

AutorAlfredo Carneiro – Graduado em Filosofia e pós-graduado em Filosofia e Existência pela Universidade Católica de Brasília.

Referência Bibliográfica


  1. CARNEIRO, Alfredo. Relação entre Deus e o Homem em Lévinas. 40p. Monografia Filosofia – UCB, Brasília-DF, 2016.
  2. LÉVINAS, Emmanuel. Totalidade e Infinito, Lisboa: Edições 70, 2008
  3. HUTCHENS B. C. Comprender Lévinas. Petrópolis: Editora Vozes, 2004


-------------------------


Excelente tudo que Lévinas diz! Um grande filósofo realmente! Mas há um pequeno grande erro: a origem do mal que assola e adoece a civilização Ocidental não é a filosofia grega de Parmênides sobre o Ser e o Não-Ser. Nem, como outros dizem, a Metafísica de Platão (Teoria das Ideias, busca do Bem), as bases racionalistas e epistemológicas de Sócrates e ampliadas Aristóteles.

Isso é errado.

Indo além de Lévinas, outros pensadores mais contemporâneos dizem que a "separação" entre o mundo sensível e o inteligível feita por Platão é a origem do fascismo do Ocidente, pois criou-se uma cultura do Centro versus periferia onde o Centro se impõe autoritariamente sobre a periferia criando a mentalidade fascista europeia, o eurocentrismo, o colonialismo, a destruição e exploração do outro, o racismo generalizado que opõe a civilização cristã e as outras. Errado, muito errado.

Tudo isso e fruto do MONOTEÍSMO, não da Filosofia Grega clássica.

Ora, se o protofascismo surge na Grécia, porque os império gregos não fizeram nada disso, pelo contrário, sincretizaram tanto com as outras culturas que acabaram sendo engolidos pelo Oriente e não o contrário? O Império de Alexandre o Grande e os Diádocos (os impérios e reinos que surgiram em disputa pelo território após a morte de Alexandre, como o Império Selêucida, o Reino Ptolemaico, o Reino Antígona e outros) impuseram a cultura grega sim MAS COM SINCRETISMO, sem apagar as culturas nativas. Pelo contrário, os gregos foram engolidos pelo Oriente e as regiões selêucidas da Pérsia e da Índia logo se tornaram reinos Indo-gregos e Greco-budistas de cultura predominantemente nativa e oriental. O politeísmo não comete genocídios nem físicos nem culturais, é uma tendência politeísta conviver pacificamente com o Outro, o diferente, o estranho.

O mesmo aconteceu no Egito, na Palestina, na Síria. Os gregos não destruíram as culturas nativas. Os Monoteístas (judeu, cristão, muçulmano), pelo contrário, cometeram genocídios, barbaridades e crimes incomensuráveis.

"Lévinas pretende romper com a ética da filosofia ocidental, que, segundo o filósofo, desconsidera a Alteridade do Outro. Para a mentalidade ocidental o Outro é aceito apenas se convertido e reduzido ao “eu“: minha cultura, religião, ideologia, filosofia ou visão de mundo."

TODO MONOTEÍSTA não suporta o Outro. A alteridade não pode existir pois é contrária ao Deus Único. Se Deus é um só então todos os outros Deuses são falsos. Um monoteísta não pode aceitar a existência de outros deuses, do contrário ele se torna politeísta. No caso, henoteísta. Se você diz que só existe um único Deus, então NÃO PODE existir outro deus. Somente uma religião, uma cultura, uma hierarquia podem existir. Porque, se é um único Deus, então sua comunidade de adoradores deve também ser única. Não pode haver outros grupos. Qualquer grupo será taxado de Seita. Percebe-se assim o nascimento do proto-fascismo, da intolerância, da discriminação elevada e níveis elevadíssimos!

No politeísmo não existe os conceitos de Heresia, Seita, Excomunhão, Ímpio, Desviado, Doutrina, Ortodoxia. Não há herege no Politeísmo. É impossível haver heresia se não existe uma doutrina única verdadeira. Todos são bem vindos com suas tradições. Não existem Deuses falsos no politeísmo: existem apenas outros deuses.

O Monoteísta não suporta o Outro. Ele quer transformar o Outro nele mesmo. Não pode haver diferença, liberdade, diversidade, independência.

Eu já falei disso aqui, desse desejo de controlar, dominar e escravizar o outro. Chamei isso de Pensamento de Yaldabaoth:

"Aliado a essa completa alienação do que é Política, os ressentidos neoconservadores comungam de um pensamento muito presente em pessoas com a mente fechada, que não concebem o mundo além das barreiras de seus próprios sentimentos. Eu chamo isso de PENSAMENTO DEMIÚRGICO, PENSAMENTO DE YALDABAOTH ou COMPLEXO DE DEMIÚRGO, o falso criador do mundo. Esse pensamento demiúrgico ocorre quando a pessoa tem um Complexo de Deus e não aceita a realidade. Para ela o caos que é o mundo não possui lógica e é preciso impor uma ordem ao caos, modelando a realidade, daí que agem como o Demiurgo. Eles não aceitam a diversidade de opiniões nem a liberdade das pessoas, pois acham que a Liberdade é a causa do "caos" e a Diversidade desestrutura a realidade modelada que eles veem como um Bloco Monolítico: tudo deve ser ordenado a partir de ideias fixas e únicas e qualquer um que saia desta Linha Única deve ser eliminado. Eles veem o mundo como estando errado e este erro é causado porque existe liberdade e diversidade. O erro do mundo, o caos e a desordem, só pode ser consertado por obediência total a um conjunto de regras que regulariam toda a existência. Este Complexo de Demiurgo faz a pessoa se tornar um mini-ditador, um mandão, criatura anti-social que quer mandar em tudo e em todos. Um exemplo: o pai policial militar que não aceita que seu filho use cabelo grande, tatuagem ou piercing, mesmo sendo um rapaz já quase adulto ou adulto pois isto é "coisa de bandido". Ou a mãe que ensina a filha que mulher tem que casar e ter filhos, não podendo casar e ficar sem ter filhos pois é contra as "leis de deus" ou da "natureza". Um pastor evangélico que conheci não admitia que homens não gostassem de futebol e achava um absurdo alguém dizer que não gostava, era algo muito errado e quase um pecado."

Este pensamento pode ser chamado de CULTURA PROTOFASCISTA ou simplesmente Pensamento Protofascista. Quando sai do âmbito pessoal e passa para o nível Estatal então se torna Fascismo, politicamente estabelecido: cultura única, destruição completa do outro.

O Monoteísmo carrega consigo, NECESSARIAMENTE, essa Cultura Protofascista.

"A forma de ver o mundo a partir de si mesmo, negando a Alteridade do Outro, é chamada por Lévinas de pensamento totalizante ou Totalidade. Contudo, é impossível viver fora da Totalidade (a identidade que formou meu ser). Por outro lado, a Totalidade não pode ser base para a ética ou a relação com o Outro."

O Livro Pistis Sophia, clássico do Gnosticismo antigo, chama isso de Autocentrado. O Autocentrado ou Authades é o Ego elevado ao seu nível máximo. Quando ele não suporta a Alteridade do Outro e quer destruir o próximo transformando o Outro nele mesmo, então tem-se o Demiurgo, Yaldabaoth, Ptahil, Autocentrado agindo.

"O que Lévinas propõe é uma nova relação entre Totalidade e Alteridade que não seja excludente e destrutiva, mas de aceitação mútua."

Pois é, Lévinas, mas isso só é possível numa cultura POLITEÍSTA. É impossível aceitar-se mutuamente sendo que sua doutrina fundamental prega a não aceitação de outros deuses!

"Desta forma, a ética em Lévinas assume caráter sagrado, pois sendo o Outro transcendente, as relações com o Outro equivalem à relação com Deus ou com o Infinito, algo além de minha capacidade de apreensão."

Por isso que o Cristianismo Verdadeiro é Gnóstico, Panenteísta: a relação com o Outro é a relação com Deus! Disse Jesus: “Em verdade vos digo que, quando o fizestes a um destes meus pequeninos irmãos, A MIM o fizestes.” (Mateus, 25: 40)

"Se o sofrimento do Outro não me afeta, é porque ele está reduzido à Totalidade, fato que me impede de ver seu Rosto. O Outro é sempre estrangeiro para mim, ainda que seja irmão, vizinho ou viajante. Mas a visão do Rosto, quando acontece, sempre surpreende, pois é visão do Outro nunca antes percebida que rompe minha Totalidade e minha ingenuidade. Deixamos de ficar “lado a lado” e ficamos “face a face”Rosto é um conceito de Lévinas que sintetiza sua ética e possui uma complexidade que não pode ser abordada em um texto introdutório."

Quando o cristão ataca o herege, ele está atacando Deus. O OUTRO É DEUS!!! O Monoteísmo e sua cegueira de negar a aceitar o outro e o diferente é uma concretização do Ateísmo e da Descrença. Ao desacreditar o Outro, nós desacreditamos Deus. Ao chamar os outros de herege nós estamos atacando e xingando a Deus, chamando o próprio Deus de herege.

Um padre católico conhecido meu me disse uma vez, num raro vislumbre de Alteridade visto em cristãos, que as outras denominações são simplesmente Outros Modos válidos de se relacionar com Deus. Achei isso belo. Mas, noutro dia, usou a palavra "pagãos" de maneira desrespeitosa e depreciativa para se referir a religiões da antiguidade. Tá vendo como o Monoteísmo tende fortemente ao fascismo? É quase impossível não ser fascista quando se é monoteísta, pois, no Monoteísmo, não pode existir o outro.

Como pode uma pessoa defender o diálogo inter-religioso um dia e no outro dia chamar os gnósticos e pelagianos de "hereges"? Defender que a Igreja em concílios fez muito bem em "vencer" as "heresias"??? Isso é absolutamente anticristão e contraditório! Cadê o Outro, cadê a Alteridade? É contraditório porque é Monoteísmo. O conceito de "herege" é tipicamente fascista.

"Querer reduzir o Outro ao pensamento é querer, com minha Totalidade, abarcar o Infinito. Mas isso, obviamente, é impossível. Se acredito que conheço o Outro, isso é apenas ilusão egoísta da Totalidade. A visão do Rosto, que é vestígio de Infinito, é a súbita percepção disso."

Quando o evangélico prega a conversão dos outros, ele quer destruir o outro. Quando o fanático político prega a destruição do outro partido e implantação de um Partido Único e centralização do poder, ele quer destruir o outro. Quando uma religião faz apologia de suas doutrinas e ataca "heresias" ela quer destruir o outro. Na base de tudo isso está o Monoteísmo, o Protofascismo.

A relação ética genuína ocorre quando a Alteridade é preservada sem, contudo, deixar de acolher o Outro em sua fragilidade e necessidade. É uma relação de passagem e aceitação, não de concordância, posse ou identidade, pois o “eu” será sempre o Mesmo e o outro será sempre o Outro.

No politeísmo não me importa se as pessoas tem outros deuses que eu não conheço. Se ela vai ou não no Templo orar, se ela reza em casa, se ela está em dia com seus ritos. Isso não interessa! O que interessa são as Festas, as Comemorações em conjunto, a alegria de compartilhar os bons momentos da vida, a celebração de valores e ideias em comum personificadas em vários deuses. Cada um tem seus deuses de devoção, suas práticas pessoais. Deuses de culturas distintas, diferentes, convivem harmonicamente. Não há conversão, não há o proselitismo do Mal que busca anular e destruir o outro, mas sim há o Proselitismo do Bem que busca acrescentar no Outro coisas boas sem retirar dele a sua essência, sem querer transformá-lo no Eu.

No Politeísmo importam as artes, as músicas, as danças, a alegria de Viver com o Outro. Tudo acrescenta, tudo soma. Não há problema no sincretismo, não há discriminação. Cada um tem seus deuses e suas formas de adorar e quem quiser sincretizar fica livre, mas quem não quer também é livre!

"Ah, então tudo é permitido e não existe pecado". Não mesmo, não disse nada disso. Tem proibições e pecado como quase todas as religiões mas não se usa isso para OPRIMIR E DESTRUIR o outro, mas para gerar o mínimo de coesão social e fazer as coisas funcionarem. Em todo lugar é preciso Lei e Ordem. Mas a Lei e a Ordem devem ser feitas e realizadas para a Harmonia Social, para diminuir a desigualdade, para gerar mais Liberdade, Igualdade e Fraternidade.

"Essa insistência de Lévinas no Outro como Alteridade (e consequentemente como Infinito) busca transportar para a ética uma das mais antigas experiências humanas: a experiência com o sagrado."

"Não se trata da experiência das religiões, principalmente quando dogmáticas, pois apenas reduzem o Outro ao Mesmo. Trata-se das autênticas experiências com a Alteridade, quando há assombro e súbita percepção de algo além de qualquer tentativa de posse ou redução."

Todo Monoteísmo é Posse e Redução do Outro. Não tem como fugir disso. Só deixando de ser Monoteísta.

"A violência é uma das chaves para o entendimento da ética da Alteridade de Lévinas, pois a redução do Outro ao Mesmo sempre gera algum tipo de violência que parte daquele que recusa ou reduz Alteridade."

Lévinas confirmando o que eu disse duas postagens atrás: O Monoteísmo fez surgir uma Era de Violência Extrema na humanidade ainda não superada. Só superando o Monoteísmo para acabar com isso.

No Monoteísmo não se enxerga o Outro. O Monoteísta não vê o Outro como um Indivíduo, Pessoa, Humano. Ele o vê como um objeto que precisa ser assimilado. Se não for assimilado, deve ser destruído.

A doença da destruição do Outro não está só na civilização Ocidental mas também na Muçulmana. Isso mostra que, diferente do que acredita Lévinas, o erro não está em filosofia grega alguma mas, sim, no Monoteísmo. 

Abaixo uma tabela didática sobre as diferenças entre Monoteísmo e Politeísmo:

MONOTEÍSMO

POLITEÍSMO

SÓ UMA RELIGIÃO É VERDADEIRA

NÃO EXISTE SÓ UMA RELIGIÃO VERDADEIRA, MAS VÁRIAS

CULTURA ÚNICA

VÁRIAS CULTURAS, DIVERSIDADE

NÃO HÁ LIBERDADE DE CULTO

LIBERDADE DE CULTO

CONTRA O SINCRETISMO

PERMITE E/OU PROMOVE O SINCRETISMO

PROSELITISMO AGRESSIVO, VIOLENTO, QUER DESTRUIR A CULTURA DO OUTRO

PROSELITISMO PACÍFICO, ABARCA O PENSAMENTO E A CULTURA DO OUTRO

SÓ UMA INSTITUIÇÃO E UM SACERDÓCIO HIERARQUIZADO

VÁRIAS INSTITUIÇÕES E VÁRIOS SACERDOTES DIFERENTES

PERSEGUE PRÁTICAS ESOTÉRICAS

TENDE A ACEITAR PRÁTICAS ESOTÉRICAS

MACHISMO E MISOGINIA, PROÍBE A MULHER DE LIDERAR E PARTICIPAR ATIVAMENTE

TENDÊNCIA DE MENOS MACHISMO OU IGUALITARISMO, A MULHER PODE TUDO OU QUASE TUDO QUE O HOMEM

HOMOFOBIA

TENDÊNCIA A ACEITAR A HOMOSSEXUALIDADE

BUSCA SE UNIR AO ESTADO PARA SE ESTABELECER COMO ÚNICA RELIGIÃO E TER PODER

NÃO BUSCA SE UNIR AO ESTADO MAS QUANDO SE UNE TOLERA OUTROS CULTOS

NEGA O OUTRO, QUER ANULAR O OUTRO E TRANSFORMÁ-LO NO EU

TOLERA O OUTRO, NÃO ANULA MAS ACEITA O OUTRO SEM QUERER IMPOR O EU

TENDÊNCIA ICONOCLASTA, CONTRA AS ARTES, A MÚSICA E A DANÇA

FORTE TENDÊNCIA ARTÍSTICA, PROMOVE, INCENTIVA AS ARTES, A MÚSICA E A DANÇA

ESCRAVIZA A MULHER, A CRIANÇA E TRATA O TRABALHADOR COMO OBJETO SEM HUMANIDADE

FORTE TENDÊNCIA A ACEITAR O DOMÍNIO DA MULHER, OS DIREITOS DAS CRIANÇAS E A MOBILIDADE SOCIAL DOS TRABALHADORES E ESCRAVOS

ESCRAVIDÃO BRUTAL DOS NEGROS E GENOCÍDIO DOS NATIVO-AMERICANOS

DEFENDE OS NEGROS DA OPRESSÃO E EMPODERA DOS ÍNDIOS COMO VERDADEIROS DONOS DAS AMÉRICAS

RACISMO, APARTHEID, FASCISMO E NAZISMO

TOLERÂNCIA, MESTIÇAGEM

CONTRA A LIBERDADE SEXUAL; CONTROLE DO CORPO ALHEIO; MULHERES E HOMENS COBERTOS DE ROUPAS SOB PENA DE EXCLUSÃO, SEGREGAÇÃO, OSTRACISMO

A FAVOR DA LIBERDADE SEXUAL, NÃO CONTROLE DO CORPO, NÃO-SEGREGAÇÃO NEM EXCLUSÃO, NEM SEGREGAÇÃO, NEM OSTRACISMO

ÓDIO, DESPREZO

COMPAIXÃO, AMOR

CONVERTA-SE OU MORRA!

NÃO EXISTE CONVERSÃO

HERESIAS, ANÁTEMAS, EXCOMUNHÃO

NÃO EXISTEM HERESIAS

DESRESPEITO AOS TEMPLOS E CULTOS DE OUTRAS RELIGIÕES

RESPEITO E SIMPATIA PELAS OUTRAS RELIGIÕES E CULTOS

UMA SÓ FORMA DE CULTO E ADORAÇÃO

MÚLTIPLAS FORMAS DE CULTO E ADORAÇÃO

CONTRA A CRIATIVIDADE

A FAVOR DA CRIATIVIDADE

LITURGIA ESTÁTICA, ESTANQUE, OBRIGATÓRIA, FECHADA, SECA E FRIA, RITOS OBRIGATÓRIOS SOB PENAS

VAI NO CULTO QUEM QUISER (ISSO SE TIVER CULTO), LITURGIAS DINÂMICAS E EM TRANSFORMAÇÃO CONSTANTE, VIVACIDADE, RITOS FACULTATIVOS

PROMOVE DEBATES PARA REFUTAR, HUMLHAR E ATACAR O OUTRO

PROMOVE DEBATES PARA SE ENRIQUECER COM O OUTRO E COMPARTILHAR CONHECIMENTOS


Nenhum comentário:

Postar um comentário