quarta-feira, 19 de novembro de 2025

Budismo Terra Pura no Brasil: conferindo se realmente tem influência gnóstica

Abaixo está uma palestra, na verdade um sermão ou pregação, proferido no Templo Budista Honpa Hongwanji de Presidente Prudente, São Paulo, pelo Reverendo Shonen Ruy Oikawa, sacerdote do templo. Recomendo que se assista porque ele dá uma muito boa aula sobre Terra Pura, vale a pena. Ele pertence ao budismo Jodo Shinshu.




Na postagem sobre Abraxas e Caulacau Parte 2 falamos mais sobre a influência do Maniqueísmo nas outras escolas importantes japonesas que não são esotéricas, que são as escolas da Terra Pura, aqui: https://gnosedesi.blogspot.com/2018/12/maniqueismo-e-budismo-esoterico-parte-3.html. Nele, ficou dito da grande possibilidade do mestre Honen, devido às suas doutrinas, ser um Maniqueísta. Honen foi o primeiro criador de um ramo independente da Terra Pura no Japão que antes era uma religião vinda da China. Ele foi influenciado pelo mestre Terra Pura chinês Shandao (conhecido como Zendo no Japão). A Terra Pura se desprendeu do Mahayana como uma seita ou ramo budista independente a partir do contato do budismo mahayana chinês com as doutrinas gnósticas Maniqueístas.

Então, no video o reverendo se identifica como adepto do budismo Jodo Shinshu que, já explicamos, foi um sub-ramo criado pelo discípulo de Honen, Shinran. Para esclarecer:

- Honen criou a primeira Terra Pura independente japonesa, escola Jodo Shu, quando encontrou os escritos de Shandao (Zendo).

- Shinran, um discípulo de Honen, criou um sub-ramo com adições de seu pensamento próprio, a escola Jodo Shinshu, se afastando de algumas crenças originais de Honen. Essas crenças são justamente crenças gnósticas maniqueístas.

  • Sobre a Fé:
No vídeo o reverendo explana várias coisas interessantes sobre o seu Jodo Shinshu que o diferenciam enormemente das outras escolas budistas japonesas. Ele começa falando da Fé, um elemento central da Terra Pura que é desprezado por outras escolas japonesas e desprezado no Ocidente (Terra Pura é o budismo mais praticado no Japão e o menos praticado no Ocidente). Ora, a Fé é um elemento gnóstico essencial mas não original do sistema. É óbvio que vem do zoroastrismo, visto que os primeiros sutras mahayanas que falam da Terra Pura são de origem sincrética zoroastro-budista e estes sutras foram traduzidos para o chinês e depois para o japonês. Não há nada especificamente gnóstico aqui. Sobre a influência e sincretismo entre Zoroastrismo e Budismo eu recomendo enormemente que se leia os artigos a respeito no site Sino-Platonic Papers de estudantes acadêmicos de altíssimo nível, vindos de diversos países, do Irã à China e EUA: http://sino-platonic.org/. Especificamente sobre budismo e zoroastrismo esse excelente artigo infelizmente em inglês: http://sino-platonic.org/complete/spp009_amida_buddha.pdf. Basicamente essa influência se deu através do Zurvanismo, um ramo herético extinto do Zoroastrismo que fez sucesso na Pérsia sassânida mas já existia como heresia anteriormente, fruto da Helenização imposto na Pérsia por Alexandre o Grande. No Zurvanismo, o dualismo ético tradicional de Zoroastro é substituído por um Monismo: acima de Ahura Mazda e Ahriman há um deus que é Tempo Infinito e Espaço Infinito, Zurvan, que se manifesta através de outros "deuses", como Ahura Mazda, Mitra e etc. Zurvan está além do Tempo e além do Bem e do Mal, é inefável e incognoscível, indefinível. Seus aspectos são Luz Infinita, Vida Infinita e outros. No artigo os estudiosos detectam que ao traduzir do sânscrito os nomes dos budas e bodhisattvas que surgem nos textos Mahayanas como Amitaba e Amitayus na verdade estão se deparando com conceitos Zurvanitas assimilados e encaixados no budismo sob a forma de neologismos em língua sânscrita. Processo idêntico é visto na maioria dos textos gnósticos reencontrados onde aramaico, hebraico e grego são usados para nomear novos deuses, anjos e divindades cujos nomes tem profundos significados filosóficos. 

Não foi somente o culto externo e a devoção ritual do Mahayana que sofreu influência das religiões persas, foi a própria filosofia mahayana.

O Profeta Mani também assimila Zurvan, usando esse deus como um dos nomes para traduzir o gnóstico Pai da Grandeza, e usando uma variante de Ahura Mazda, Ohrmizd ou Ohrmazd Bay para traduzir o Homem Primordial (Homem Arquetípico, Primeiro Ser Humano, Homem Primitivo). Desse modo, por duas vias, pelo Mahayana e pelo Maniqueísmo, filosofias gregas e helenísticas penetraram profundamente na China. Mas concluindo, a Fé em Amitabha não é uma devoção originalmente budista mas é profundamente persa, de talante zoroastriano zurvanita.

  • Sobre Meditação:
Aqui já vemos o gnosticismo. O reverendo explica que, ao contrário da maioria dos outros budismos, a Terra Pura não tem uma prática meditativa obrigatória, ficando a critério do monge responsável de cada templo decidir se faz ou não. O que se aproxima dela é o Nembutsu, que em outra oportunidade falaremos. Segundo ele, não faz sentido buscar meditação pois é algo somente para monges e renunciantes que podem ter tempo livre de sobra para ficar muitas horas sentados em posição de lótus meditando. Além disso a meditação não é algo indispensável para a evolução espiritual. A devoção e o estudo e prática dos ensinamentos Terra Pura são mais eficazes. Ora, essa concepção é fortemente Maniqueísta. O único texto maniqueísta que encontrei ordenando práticas meditativas é uma Carta Apócrifa de Mar Mani a Mar Ammo. Essa carta é contestada e não há certeza se é legítima ou não devido à sua linguagem e termos que expressam um momento posterior do Maniqueísmo na ásia central, depois da morte do Profeta Mani. Nessa carta, Mani diz:

"Da mesma forma, nestes tempos pecaminosos, o denavar (devoto maniqueísta) puro deve sentar-se em meditação piedosa (andesisn) e deve se afastar do pecado e desenvolver o que é bom"

Fora isso não achei outro texto maniqueísta ordenando a meditação. Nos fragmentos reencontrados no Egito e nos outros fragmentos das obras originais de Mani não há citação alguma de práticas meditativas, o que se supõe que sua obrigatoriedade veio a existir somente em uma região específica da ásia central. É óbvio que Mani conhecia técnicas de meditação, pois ele estudou o budismo. Além disso seus textos contam que ele pessoalmente, em sua grande jornada missionária pelo oriente, foi até o sul do Vale do Rio Indo, na Índia, e converteu um rei budista. Essas regiões já estavam todas muito influenciadas não só pelo budismo mas pelas outras seitas Sramana como o Jainismo que também tem técnicas de meditação e yoga. O fato é que no Maniqueísmo a meditação não é uma prática central ou obrigatória. Isso é bem gnóstico e provavelmente é a influência maniqueísta nas terras puras chinesa e japonesa. A Gnose, ou seja, o Samadhi ou Satori, a Iluminação, é a experiência direta da Realidade Suprema, que é Deus, corrigindo todas as heresias e concepções errôneas. Para atingir isso é necessário buscar, querer encontrar, querer experimentar. Isso não depende de meditação, mas de Vontade e Humildade. O primeiro passo é reconhecer a própria ignorância. O segundo é invocar a Sabedoria. O terceiro é agir cotidianamente para se unir à Sabedoria. Isso pode ser feito estudando filosofia, estudando religiões, orando, rezando, jejuando, fazendo boas ações, ajudando os outros e, principalmente, concentrando a Mente na Sabedoria. Eu mesmo atingi a Gnose e obtive um êxtase profundo enquanto lia livros de Platão. Nessa época não conhecia nem meditação nem gnosticismo. Foi uma situação que depois achei engraçada. Estava lendo sobre as Ideias e o Mundo Inteligível nos diálogos platônicos quando fui arrebatado para um estado de suspensão da alma, como se estivesse flutuando nos ares, mas estava ainda no corpo, só que meu corpo era diferente, como se não fosse mais matéria mas puro espírito. Vi e experimentei um monte de coisas, eu me lembro bem pois fiquei estranho para as outras pessoas. Um conhecido passou e me viu olhando fixo para o céu e disse de longe: "mentaliza, mentaliza, é isso aí". Ele estava fazendo troça, zombaria boba. Eu não consegui me importar pois estava tão submerso na união mística que só queria ficar para sempre naquele "lugar". Eu realmente nunca consegui atingir êxtases místicos ou visões espirituais com meditação. Por meditação, aqui, eu me refiro à meditação mais comum conhecida, a pura observação da respiração, da mente etc. É mais comum a mim atingir a Gnose profunda na prática da Concentração Mental nas Ideias Inteligíveis segundo Platão. Ou durante cânticos espirituais, prática de Hesicasmo e leitura de textos como os de Platão, Paramahansa Yogananda, Swami Vivekananda e os próprios textos gnósticos reencontrados, quando tento entendê-los e me concentro nos aeons e seus processos de emanação. Enfim, meditação no gnosticismo não é algo necessário para se atingir a Gnose. Mas é bom pois ajuda muito no autoconhecimento e no detectamento dos defeitos pessoais, das paixões, apegos, maus pensamentos e maus sentimentos. Esse desapego da Terra Pura pela meditação é igualzinho ao pensamento gnóstico sobre essa prática. Útil e boa mas não necessária. O reverendo diz que mais importante que meditação é o Dharma, ou seja, o Ensinamento, a Doutrina. Isso é gnóstico, pois a doutrina gnóstica é fruto de experiências diretas e essas experiências escritas e reformuladas em dogmas e práticas ajudam os outros a terem as experiências parecidas, ou seja, a Gnose.

  • Sobre os Rituais:
O reverendo cita rapidamente que os rituais Terra Pura são semelhantes à missa católica. Isso não se dá, como mentem os perenialistas guenonianos e schuonianos, por uma suposta "sabedoria perene" mas sim pelo gnosticismo que influenciou tanto a Terra Pura quanto a missa católica, esta última que plagiou descaradamente os cultos de Teurgia gnósticos egípcios. Em nenhum dos "padres apostólicos", mesmo em Orígenes, Ireneu de Lyon ou Clemente de Alexandria se vê uma missa como a inventada pelos papas. O ritual era extremamente simples e rápido. Leiam a Didaqué, a Doutrina dos Apóstolos, antigo texto muito dualista, ascético e que pouquíssimas vezes fala a respeito do "criador", mostrando que é um texto do período em que o catolicismo não existia e o gnosticismo cristão era bem mais moderado. Nesse texto há a descrição de como deve ser feito o ritual da Eucaristia. Não há nada semelhante com qualquer missa católica ou ortodoxa, exceto algumas expressões bíblicas. Até o Pão e o Vinho foram substituídos pela estranha hóstia...

  • Salvação como consequência do Conhecimento:
O reverendo diz que a Salvação no budismo Terra Pura não é feita através do sacrifício físico da meditação em posição de lótus mas sim através do conhecimento. E esse conhecimento é gradual. Ele diz que é através dos ensinamentos que se consegue mudar o raciocínio e ter o domínio sobre a mente. Isso vai de encontra aos textos budistas que prescrevem técnicas meditativas obrigatórias para se livrar do sofrimento e da ignorância. No entanto isso é perfeitamente gnóstico. Ler os diálogos de Platão é um excelente exercício de aquisição de Sabedoria, pois o texto nos transporta para um estado contemplativo e meditativo da Alma.

  • Dualismo cósmico:
O reverendo afirma que segundo a visão Terra Pura a vida na terra é um Inferno. Sua concepção do mundo material é negativa. O mundo material tem um caráter malévolo, maligno. Estamos sempre necessitando atacar e ofender outros seres para sobreviver, sendo obrigados a isso, tanto os seres humanos quanto os animais, as bactérias, protozoários, plantas e todos os seres vivos e isso não é característica de um mundo bom criado por um Deus mas de um inferno. Ora, isso é um pouco diferente da visão budista que diz que o mundo material é uma grande Ilusão, Maya. Esse pessimismo em relação ao mundo material obviamente é gnóstico. São os gnósticos que chegam a dizer que o criador desse mundo é um falso deus, ou seja, um demônio. Um mundo estruturalmente maligno,  ou seja, um inferno, não pode ser criação de Deus mas sim de um demônio. Nem zoroastrismo nem zurvanismo percebem o mundo material como maligno. Nem a religião egípcia tem esse pessimismo. Isso é de origem platônica. Platão disse que O CORPO É PRISÃO E TÚMULO DA ALMA. Presa na falsidade da matéria, a alma não consegue captar as essências Inteligíveis que formam o Verdadeiro Mundo. A alma deve buscar o Mundo Inteligível enquanto presa aqui nesse mundo para, quando morrer, poder ir para o Verdadeiro Mundo e não reencarnar no inferno que é a Terra novamente. No gnosticismo a transmigração da alma é de origem budista e platônica; a Terra Pura é o Paraíso zoroastriano; já o dualismo cósmico pessimista é gnóstico e platônico.

  • Preexistência da Fé dentro de toda pessoa
O reverendo diz que a Fé não deve ser buscada fora, nas coisas externas, mas dentro de si através do autoconhecimento. Ela já mora dentro de nós e deve ser despertada pois é nossa verdadeira natureza. Não é preciso dizer que essa doutrina da pré-existência da Verdadeira Natureza dentro das pessoas é exatamente a Centelha Divina, a Partícula de Luz gnóstica. Essa é toda a doutrina de Pistis Sophia e do Maniqueísmo. O "despertar da fé interior pré-existente" absolutamente não é budista.

Mas nem tudo são flores. O Jodo Shinshu permite o uso moderado de alcool, o consumo de carnes e monges casados, coisas impensáveis no maniqueísmo. Isso confirma o que foi dito na postagem sobre Abraxas e Caulacau Parte 2 https://gnosedesi.blogspot.com/2018/12/maniqueismo-e-budismo-esoterico-parte-3.html, que Shinran reformou muitas práticas maniqueístas afastando seu Jodo Shinshu do maniqueísmo em direção a uma tendência mais japonesa de budismo.

Podemos dizer assim que o budismo Terra Pura Japonês, como originalmente fundado por Honen, era na verdade Maniqueísmo simplificado em direção a uma teologia Terra Pura chinesa. Basicamente Honen seguiu as doutrinas de Shandao que adaptou o Maniqueísmo a uma cosmogonia e teologia Terra Pura: ele retirou todo o mito cosmogônico maniqueísta e substituiu pela teologia da Terra Pura, permanecendo contudo com a ética, a moral, os valores, virtudes e doutrina da salvação gnóstica pelo conhecimento conforme o Maniqueísmo. Só de ter como estruturantes no sistema a cosmologia dualista, a salvação pelo conhecimento e o ascetismo vegetariano-celibatário já caracterizam o Jodo Shu de Honen como uma religião verdadeiramente gnóstica.

Depois, seus discípulos passaram a modificar a doutrina, criando sub-ramos, alguns se distanciaram muito do maniqueísmo, no entanto perpetuando outros dogmas maniqueístas. Ou seja, o budismo Terra Pura japonês é uma amálgama entre Maniqueísmo, Budismo Mahayana e práticas nativo-japonesas.

Perceba a importância disso tudo. O maniqueísmo pouquíssimas vezes foi tratado como heresia no Japão. Pelo contrário, na maior parte das vezes foi o motivador da fundação de escolas budistas eminentemente japonesas que existem até hoje e são símbolos da cultura nacional. Enquanto o Ocidente se afundava na Idade das Trevas, do terror e do fanatismo, o Gnosticismo brilhava e banhava quase toda a Ásia com sua Luz.

CONCLUSÃO

A ignorância dos adeptos da brega e cafona "filosofia perene" que ignoram o roubo do gnosticismo por todas as coisas que eles dizem ser "tradicionais" é um fenômeno grotesco. A única filosofia perene é a Gnóstica. A única Sabedoria Perene é a Gnóstica. A única Unidade Transcendente das Religiões são os plágios e roubos de ideias, práticas e conceitos gnósticos que influenciaram todas essas tradições que, agora, negam sua origem ladrônica (de ladrar, furtar) e inventam uma outra história fictícia e fantasiosa sobre um suposto "perenialismo" extremamente idiossincrático e forçado. Tudo o que eles detectam como sendo "filosofia perene" na verdade são as doutrinas e dogmas explanados e constantes dos textos gnósticos reencontrados - dogmas e doutrinas roubados e plagiados e que foram parar em tudo quanto é lugar, no Islã, no Catolicismo, no Neoplatonismo, no Hinduísmo e etc. No futuro iremos expor o erro absurdo de certos tariqueiros que surge quando inventam de identificar a Sabedoria Eterna com uma suposta "tradição" política, como se a Experiência Direta e Pessoal da Realidade Suprema pudesse ser igualada, rebaixada e confinada a certos e determinados costumes e culturas de povos e religiões pré-selecionados, o que seria corrompê-la e matá-la. Ainda exporemos os objetivos escusos desses inimigos de influenciar politicamente em direção a um movimento revolucionário e espalhar os horrores do Islã pelo mundo.

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