quarta-feira, 19 de novembro de 2025

Os Arcônticos - Parte 2, FINAL: Alienígena, uma autobiografia espiritual

PADRE DO DESERTO

Agora então vamos tratar do texto Alógenes. Já postei no Drive o texto com o nome Apocalipse de Alógenes  https://drive.google.com/drive/folders/1XITCmvLfQIiHLBPSzTVff9Bm4gpWlnyO e recomendo muitíssimo que se leia tudo, ou pelo menos a versão de Bentley Layton que está no mesmo PDF e consiste em excertos da Escritura, a que tem várias notas e referência pelo texto. Eu postei duas traduções juntas num mesmo arquivo para compará-las, pois é bom termos várias traduções de textos antigos assim. Uma única tradução pode não ter usado palavras corretas para exprimir o sentido original do texto e, tratando-se de língua copta em caracteres gregos, é melhor termos traduções diferentes para analisar com mais imparcialidade.

Vamos falar sobre a história do texto. Allogenes/Alogênio/Alógenes/Alógeno/Alienígena, cuja tradução mais exata para nossa língua portuguesa seria ESTRANGEIRO é um texto apocalíptico gnóstico. Devido ao uso do termo Barbelo para indicar um dos mais elevados aspectos de Deus, o texto com toda certeza deve ser caracterizado como, no mínimo,  barbelonita.

O Alienígena foi citado pelo filósofo Porfírio em sua obra Vida de Plotino. Segundo ele, muitos cristãos e outros frequentadores da Escola Neoplatônica de Plotino, adeptos de um certo Adélfio e de Aquilino e que possuíam muitos escritos de Alexandre o Líbio, Filocomo, Demóstato e Lido, apresentavam Apocalipses (Revelações) de Zoroastro, Zostrianos, Nicotheos, Alógenos, Messos e outras pessoas parecidas. Plotino e seus discípulos se viram ameaçados e passaram a refutá-los nas suas reuniões e a escrever livros. Contra os Gnósticos de Plotino sobreviveu aos nossos dias.

É totalmente provável que esse Alógenos reencontrado em Nag Hammadi é o mesmo que apareceu criado por gnósticos na escola de Plotino. Basta ler o texto para perceber. 

Vamos fazer uma pequena retrospectiva da Igreja Barbelo-Setiana. Não dá para fazer aqui uma postagem bem feita sobre toda a gênese do pensamento gnóstico alexandrino porque eu teria que falar de Fílon e um monte de filósofos medioplatônicos e isso me demandaria uma enormidade de tempo e tornaria a postagem cansativa demais. Portanto, como venho fazendo desde o começo do blog, vou citar e falar aqui em doutrinas, nomes, conceitos e termos que PRESSUPONHO que o leitor já conheça. Mesmo assim, se não conhecer, conto com a curiosidade do leitor para que busque esses termos em pesquisas e assim se aprofunde e se localize.

Não se sabe ao certo quando essa religião começou a existir, mas pode-se traçar mais ou menos seu provável período de existência com os textos reencontrados em Nag Hammadi, observando suas doutrinas e comparando com o momento histórico em que elas existiram. 

O medioplatonismo foi um reavivamento da Academia de Platão que ocorreu em Alexandria, no Egito. Enquanto em Atenas a Academia morria, sufocada num Ecletismo inócuo, em Alexandria, como num milagre, graças a característica cosmopolita da cidade, que recebia influxos diretos de filosofias e religiões orientais e que via um borbulhar imparável de novos cultos religiosos sincréticos, o platonismo renasceu muito mais forte. Os primeiros nomes do Medioplatonismo remontam ao começo da segunda metade do século 1 antes de Cristo: Dercílides e Eudoro de Alexandria. Apesar de Platão poder ser considerado um místico e, de fato, sua filosofia ter como base princípios esotéricos derivados de instâncias religiosas de cultos de mistério como o Orfismo e o Pitagorismo bem como da religião egípcia, os medioplatônicos aprofundaram enormemente no misticismo e, agora, diretamente em contato com religiões orientais como Judaísmo, Zoroastrismo, religião Babilônica, tradições Sramana da Índia (Jainismo e Budismo), bem como do próprio Bramanismo, puderam, livre da forte influência das filosofias helenísticas como Estoicismo, Epicurismo, Ceticismo e Cinismo, se dedicar ao misticismo tão intensamente que pela primeira vez na história da humanidade surgiu o que verdadeiramente pode se chamar de TEOSOFIA (Sabedoria de Deus). Teosofia é justamente a análise comparativa entre as diversas religiões buscando pontos em comum, muitas vezes produzindo sincretismo religioso. Por favor, não confundir isso com a Sociedade Teosófica de Helena Blavastky que faz um tipo de teosofia a seu modo - não estou falando disso mas sim da filosofia mística sincrética de origem platônica da antiguidade tardia cujo nascedouro é o Egito. Nascendo no século 1 antes de Cristo no Egito, o medioplatonismo se difunde no Ocidente (Roma) e floresce no século 2.

Ao compararmos todos os textos gnósticos, sejam mitológicos, sejam céticos, vemos neles uma constante notável: o Mito da Sabedoria (Alma), sua queda e sua jornada de volta ás origens. Recomento MUITO que leiam essa postagem um pouco mais detalhada sobre o Mito da Sabedoria no gnosticismo: https://gnosedesi.blogspot.com/2014/12/sophia-origem-e-significado-no.html. Depois de muito analisar as concepções gnósticas podemos concluir  com certeza que o Mito Clássico de Sophia deriva diretamente de uma habilidosa fusão entre:

A) a concepção platônica da Alma como vemos nos diálogos Fédon, Fedro, República e outros textos com o mito da Sabedoria como companheira de Deus e Deusa no Céu como vemos no Velho Testamento em Provérbios, Sabedoria de Salomão, Jesus Ben Sirach e outros;

B) a doutrina do Demiurgo como descrita no diálogo Timeu de Platão combinada com o mito da criação do Jardim do Éden descrito no Gênesis bíblico. 

c) a vida após a morte, ou seja, o estado da Alma após a saída do corpo conforme a tradição religiosa egípcia com a Alma após a morte de Platão, a Alma após a morte no Zoroastrismo e a Alma após a morte na religião babilônica.

Segundo Bentley Layton, e eu concordo inteiramente com ele nesse ponto, o Mito Gnóstico Clássico ou Mito Barbelonita-Setiano não é fruto de ríspidos e idiossincráticos sincretismos populares mas sim criação de uma engenhosa mente altamente filosófica, uma criação literária de poetas teólogos, um elaborado poema simbólico. Não é um produto espontâneo de uma determinada cultura, população, tribo ou povo, mas é uma construção, acima de tudo, filosófica. O próprio testemunho de Porfírio segundo o qual os alunos de Plotino, portanto fortes candidatos a filósofos, eram os responsáveis por uma nova leva de escrituras gnósticas é revelador. Textos como Apócrifo de João, Pistis Sophia, Apocalipse de Adão, Três Estelas de Seth e muitos outros tem origem em escolas filosóficas. E analisando os textos barbelo-setianos mais antigos vemos justamente uma profunda, clara e óbvia estrutura medioplatônica. Dessa construção filosófica emergiu o maior mito da história da humanidade, capaz de explicar todas as religiões e fonte infinita de plágios, roubos e adulterações feitas por todas as religiões possíveis, com inveja por serem incapazes de produzir o mesmo; mito que, segundo Carl Jung, é a manifestação mais sublime da Psiqué humana, a maior expressão da luta do ser humano para adquirir a Plenitude, a mais profunda expressão da Alma em sua busca pelo Ser.

Embutido no Mito de Sophia estão todas as instâncias e concepções medioplatônicas. Dada a ausência de conteúdo cristão em alguns dos textos barbelo-setianos clássicos encontrados é de se supor que o gnosticismo clássico seja pré-cristão e tenha tomado sua forma final no início do cristianismo quando tomou contato com este. Assim, podemos concluir com certa margem de realidade que o gnosticismo barbelo-setiano surge e se desenvolve concomitante ao Medioplatonismo. De fato, Barbelo-setianismo e Medioplatonismo parecem dois filhos de um mesmo pai: o platonismo. Mas enquanto os medioplatônicos permaneceram com o mito do Demiurgo do Timeu apenas reinterpretando-o com novos desenvolvimentos, os barbelonitas transformaram o mito platônico em outra coisa muito mais profunda. Dado que Fílon, platônico judeu nasceu provavelmente no ano 15 antes de Cristo e que ele é a mais antiga fonte de termos e concepções tipicamente gnósticas como Adão Celestial e muitos outros, e dado ainda que o mais antigo texto gnóstico, a Epístola de Eugnosto não ultrapassa o século 1 depois de Cristo como data de sua composição, é bastante provável que a partir da publicação das obras de Fílon vários filósofos judeus medioplatônicos já possuidores de uma mentalidade mística começassem a ousar escrever suas próprias concepções e experiências filosóficas e religiosas, dando origem ao Mito de Sophia.

Dentre as concepções medioplatônicas assimiladas pelo mito gnóstico estão:

1 - Forte ênfase na absoluta imaterialidade de Deus, que é absolutamente transcendente: Deus é realidade Imaterial e Imutável, está muito longe da Terra, incontaminado, incorruptível, puro de toda matéria que sofre destruição e morte. Deus é o Verdadeiro Ser, o único Ser, ao contrário do mundo material o qual não é ser pois está sempre em mudança.  (Plutarco. Sobre Isis e Osiris 382f).

2 - Ênfase Dualista: a forte separação entre Deus e o Mundo percebida na filosofia medioplatônica é de clara origem Zoroastriana. Plutarco testemunha a assimilação do dualismo persa pelo medioplatonismo que o adapta ao platonismo e o usa para interpretar alegoricamente os mitos de várias religiões, especialmente o mito de Isis e Osíris.

3 - Teologia Apofática: Se Deus é tão absolutamente transcendente, fica impossível para o homem conceber mentalmente e determinar a essência de Deus, e, portanto, é impossível exprimi-la com palavras ou raciocínios. Essa doutrina da Incognoscibilidade de Deus aparece em Fílon de Alexandria e obviamente tem origem nas tradições Sramana e nos gimnosofistas indianos. É daqui, do gimnosofismo yogi indiano e dos Sramana que vem tanto o Ceticismo filosófico de Pirro quanto o Ceticismo religioso do Evangelho de Tomé e do Cristianismo Tomeísta, também chamado Thomasine. Nas regiões da Síria, norte da Mesopotâmia (Osroene, Edessa), formou-se a tradição mais primitiva do cristianismo, testemunhada pela literatura tomeíta: Evangelho de Tomé, Livro de Tomé Contendor e Atos de Tomé. Esse misticismo cético característico de várias tradições Sramana é fortemente perceptível na Literatura Tomeíta e não é de se admirar que Tomé tenha sido o Apóstolo da Índia e justamente as escrituras em nome dele são as que mais se vê a influência da filosofia heterodoxa indiana. O fato de Tomé ser rebaixado e vilipendiado nos evangelhos canônicos, acusado de "só ver para crer" é possivelmente uma prova da raiva que os proto-católicos tinham dos Apóstolos que desenvolveram cristianismos independentes, tentando falsificar a história do cristianismo e denegrindo as doutrinas ensinadas por Tomé, Maria Madalena, Felipe e outros. Um profundo ceticismo perpassa a maioria das escolas Sramana, principalmente a Lokayata (Charvaka) e Ajivika que acabaram se caracterizando como ateístas.

Voltando ao Apofaticismo, Fílon o exprime de forma esparsa em várias de seus livros. Mas é com os medioplatônicos que aparece a descrição apofática "de página inteira", sob a forma de um "textão" onde vai ser dizendo tudo o que Deus não é. Vejamos um exemplo típico, o medioplatônico mais famoso de todos, Albino, que nasceu no final do século 1 depois de Cristo:

"É inefável e captável apenas com o intelecto, como se disse, pois não é gênero, nem espécie, nem diferença específica e, nem mesmo, por outro lado, lhe compete qualquer especificação, nem má (porque não é lícito dizer isso) nem boa (pois ele seria bom por participação em alguma coisa, e especificamente na bondade); nem é indiferente (porque isso não corresponde à sua noção). Nem se lhe atribui qualidade (porque não tem nada a ver com qualidades e é perfeito independentemente da qualidade), nem é sem qualidade (porque não é privado de qualidades que com ele possam competir). Não é parte de alguma coisa, nem tem partes como um todo, nem, por consequência, é igual a qualquer coisa, nem diferente; nada, com efeito, se lhe acrescenta por força da qual possa ser separado das outras coisas; nem move, nem é movido". (Albino. Didascálico, X, 4).

Agora vejamos um trecho da Epístola de Eugnosto encontrada em Nag Hammadi:

"Ele-que-É é inefável. Nenhum princípio jamais o conheceu, nem autoridade, nem sujeição, nem qualquer criatura desde a fundação do mundo, exceto ele mesmo. Pois ele é imortal e eterno, sem nascimento; pois aqueles que possuem nascimento perecerão. Ele não é gerado, não tem um princípio; pois aquele que tem um princípio tem um fim. Ninguém reina sobre ele. Ele não tem nome; pois aquele que tem nome é criação de outro. Ele é inominável. Ele não tem forma humana; pois aquele que tem forma humana é criação de outro. Ele possui sua própria semelhança - não é como a semelhança que recebemos e vemos, mas uma semelhança diferente que ultrapassa todas as coisas e que é melhor que as totalidades. Ele olha para qualquer lado e vê a si mesmo em si mesmo. Ele é infinito. Ele é incompreensível. Ele é ainda imperecível e não se parece com coisa alguma. Ele é imutavelmente bom. Ele é perfeito. Ele é perpétuo. Ele é bem-aventurado. Ele é incognoscível, apesar de conhecer a si mesmo. Ele é imensurável. Ele é não-identificável. Ele é perfeito e não possui defeito. Ele é imortalmente bem-aventurado. Ele é chamado de Pai do Universo". (Eugnosto, o Bem-Aventurado).

Vejamos também esse trecho do Apócrifo de João:

"E eu perguntei por curiosidade, e ele me disse, "A União é uma monarquia com nada acima dela. É o Deus e Pai do Todo, o sagrado, o invisível, que existe acima do Todo. Aquele que é o Pai de imperecibilidade, existindo como luz pura, dentro da qual nenhum olho consegue olhar.

Ele é o Espírito Invisível. Não é correto pensar Dele como um deus, ou algo similar. Porque Ele supera divindade. É um domínio que não tem nada acima Dele para governá-lo. Porque não há nada existindo antes Dele, nem Ele necessita deles. Ele não necessita de vida. Pois Ele é eterno. Ele não precisa de nada. Ele não pode ser aperfeiçoado, como se Ele fosse deficiente e necessitasse de aprimoramento; pelo contrário, Ele é sempre completamente perfeito. Ele é luz. Ele não pode ser limitado, já que não há nada anterior a Ele para o limitar. Ele é insondável, já que não existe ninguém anterior a Ele para o examinar. Ele é imensurável, porque não há alguém anterior a Ele que possa medí-lo. Ele é invisível, já que ninguém é capaz de visioná-lo. Ele é uma eternidade existindo eternamente. Ele é inefável, já que ninguém foi capaz de compreendê-lo para falar sobre Ele. Ele é inominável, já que não há ninguém anterior a Ele para dar-lhe um nome.

Ele é luz imensurável, o puro, que é sagrado e impoluto. Ele é inefável, sendo incorruptivelmente perfeito. Ele não é perfeição, nem bem-aventurança, nem divindade, pois Ele é algo muito superior a estes. Ele não é indelimitado nem delimitado, mas Ele é algo muito superior a estes. Ele não é corpóreo nem incorpóreo. Ele não é grande nem pequeno. Ele não é uma quantidade. Ele não é uma criatura. Nem é possível que alguém o compreenda. Ele não é algo que pertença ao Todo que existe, pelo contrário, Ele é algo que é melhor do que isso. Não que Ele seja simplesmente superior, como se Ele fosse comparável aos outros, mas Ele é algo que pertence a Si próprio.

Ele não participa em um aeon (como parte consituínte dele). O tempo não existe em relação a Ele. Pois qualquer um que participa em um aeon foi criado. O tempo não foi determinado a Ele, já que Ele não recebe nada de outro que estabelece limites. E Ele não necessita de nada.

Nada do Todo existe antes Dele. Ele é suficiente para si próprio em sua luz perfeita. Porque a perfeição é majestosa. Ele é mente pura imensurável. Ele é um aeon doador-de-aeon. Ele é vida doadora-de-vida. Ele é uma bem-aventurança doadora-de-bem-aventurança. Ele é sabedoria doadora-de-sabedoria. Ele é bondade doadora-de-bondade. Ele é piedade e redenção doadores-de-piedade. Ele é graça doadora-de-graça, não porque ele as tem, mas porque Ele doa a luz imensurável e incompreensível.

Como eu devo falar Dele com você? Ele é um aeon indestrutível, em repouso, existindo em silêncio, em tranquilidade, e sendo anterior a tudo. Pois Ele é o topo de todos os aeons, e é Ele quem os dá força e bondade. Porque nós não conhecemos as coisas inefáveis, e nós não compreendemos o que é imensurável, exceto por aquele que veio Dele, ou seja, do Pai. Pois foi ele quem disse para nós somente. Porque é ele quem se olha na luz que o envolve, isto é, a nascente da água da vida. E é Ele quem doa para todos os aeons, de todos os modos, e que observa sua própria imagem visível na nascente do Espírito. É Ele quem coloca sua vontade na fonte da água-luz pura que o envolve. (Apócrifo de João, o Livro Secreto de João).

Vejamos também o Sūtra da Essência da Prajñā-pāramitā ou Sutra da Essência da Perfeita Sabedoria - Sutra do Coração:

"Quando o Bodhisattva Avalokiteśvara cultivava a profunda Prajñā-pāramitā percebeu com clareza que os cinco agregados são śūnya e transcendeu todo o sofrimento e a dificuldade.
Śāriputra, a forma não é diferente do Śūnyatā, o Śūnyatā não é diferente da forma. A forma é precisamente Śūnyatā, o Śūnyatā é precisamente a forma; o mesmo acontece com a sensação, percepção, volição e consciência.
Śāriputra, todos os fenômenos tem Śūnyatā como característica essencial. Eles não surgem nem cessam, não são impuros nem puros, não crescem nem diminuem.
Por essa razão, no Śūnyatā, não existe a forma, nem a sensação, percepção, volição ou consciência; nem olho, ouvido, nariz, língua, corpo ou mente; nem forma, som, odor, sabor, tato ou pensamento; nem o 'domínio do olho' até o 'domínio da consciência'.
Não existe a ignorância nem a cessação da ignorância, nem mesmo a velhice e morte ou a cessação da velhice e morte.
Não existe o sofrimento, nem a origem do sofrimento, nem a cessação do sofrimento, nem um caminho para a cessação do sofrimento.
Não existe a sabedoria nem sua obtenção, porque não há nada a ser obtido.
O Bodhisattva, acolhendo-se na Prajñā-pāramitā, vive com a mente livre de obstáculos. Sem obstáculos, ele não sente temor, abandonando as visões errôneas e as ilusões, tem o Nirvāṇa como meta final.
Todos os buddhas dos três periodos, acolhendo-se na Prajñā-pāramita alcançam Anuttarā-samyak-saṃbodhi.
Por essa razão, reconhecemos que a Prajñā-pāramitā é o mantra de grande poder, é o mantra da grande sabedoria, é o mantra supremo, o mantra inigualável, que pode remover todo sofrimento, é verdadeiro e não é falso.
Por isso recitamos o mantra da Prajñā-pāramitā, que diz assim:
Gate, gate, pāra-gate, pāra-saṁgate, bodhi svāhā.

Não se sabe exatamente quando foi escrito pela primeira vez o Sutra do Coração. Ele faz parte das Escrituras da Prajna Paramita e, junto com o Sutra do Diamante, fazem parte do grupo das primeiras escrituras Mahayana que surgiram por volta dos séculos 1 e 2 depois de Cristo no norte da Índia, mais especificamente na região do Império Kushana que se tornou grande patrocinador do Budismo em sua forma Mahayana. Essas escrituras mahayana são caracteristicamente sincréticas às religiões indo-iranianas que existiam no Império Kushana: Zoroastrismo, Mitraísmo e cultos pré-zoroastrianos da ásia central. São Escrituras da Prajna Paramita o Sutra do Coração, Sutra do Diamante, Sutra da Guirlanda de Flores e o Sutra de Lótus. Sabemos que a religião oficial do Império Kushana era politeísmo iraniano pré-zoroastriano sincretizado com politeísmo grego, porém a liberdade religiosa era garantida e budismo e hinduísmo também exerciam influência principalmente nas divindades sincréticas. Sabemos que os gregos haviam instalado a civilização grega e sua filosofia nessas regiões desde Alexandre o Grande e que os principais filósofos Mahayana foram influenciados pelo modo grego de pensar. Já falamos sobre isso aqui: https://gnosedesi.blogspot.com/2018/05/maitreya-cristo-cosmico-budismo.html

Ora, tanto a filosofia Medioplatônica quanto o Gnosticismo Judaico, o Budismo Mahayana e o próprio Cristianismo datam de praticamente a mesma época, entre o século 1 antes de Cristo e o século 2 depois de Cristo. Todas essas tradições parecem ter se encontrado, enfrentado, sincretizado e, séculos depois, se separado sob novas formas produtos do inter-sincretismo. Por exemplo, as missões budistas em 300 antes de Cristo influenciaram no surgimento dos judeus Essênios. Posteriormente, em Alexandria, judeus e cristãos  influenciados pelo Budismo por sua vez produziram novos desenvolvimentos das doutrinas e então foram os Budistas que passaram a ser fortemente influenciados por esses novos ensinamentos que foram para a Índia sob a forma do gnosticismo. Outro exemplo, os filósofos platônicos se estabeleceram em Alexandria e foram influenciados pelo culto da religião egípcia - em contra mão, a filosofia platônica influenciou profundamente a teologia egípcia e os cultos de mistérios como o de Isis. E assim foi com gregos e persas, cristãos e indianos, egípcios e persas, indianos e gregos, babilônicos e persas e etc. Essa época era muito confusa, os impérios ora perdiam ora conquistavam os mesmos territórios, havia muita agitação geo-política, ora hindus estavam no governo, ora os persas, depois gregos, depois judeus, depois romanos, depois gregos de novo, depois persas de novo, depois pequenos estados semitas de origem babilônico-assíria, depois fenícios, depois romanos de novo... Tudo muito misturado, muito confuso, e foi nessa confusão que medioplatonismo, mahayana, gnosticismo e cristianismo surgiram dividindo os mesmos espaços.

4 - Deus como Ser, diferente de Deus como o Uno conforme Platão. Com certeza essa concepção os medioplatônicos retiraram de Fílon, pois é bíblica e do velho testamento. Em Êxodo 3:14 Deus ensina a Moisés que ele é Aquele que É. Essa definição suprema de Deus impactou os medioplatônicos que, tendo contato com as doutrinas de Fílon, adaptaram isto. Exemplo é Plutarco no seu tratado Sobre o E de Delfos, no qual ele de forma original e diferente do platonismo define Deus como Ser, o Verdadeiro Ser, contraposto ao homem e a todas as coisas do mundo material e sensível. Deus é o Ser Imóvel na dimensão do eterno. O "E" do Templo de Delfos significa "EI" que quer dizer "Tu És". Plutarco diz:

"Mas Deus - seria preciso dizê-lo? - É; é, digo, não já segundo o ritmo do tempo, mas no eterno, que é imóvel, atemporal, sem vicissitudes; e não admite nem antes, nem depois, nem futuro, nem passado, nem idade de velhice ou de juventude. Não, Ele é uno e na unidade do presente preenche o "sempre": o que nesse sentido existe realmente, o "é" unicamente: não advém, não será, não começou, não acabará". (Plutarco. Sobre o E de Delfos).

5 - Conciliação de Platão com Aristóteles: substitui-se a concepção platônica de Deus como Suprema Ideia (Bem) para concebê-lo como Suprema Inteligência ou Pensamento. O Mundo das Ideias é concebido como produto do Pensamento de Deus, ou seja, fruto da Inteligência Divina, conciliando assim a Doutrina das Ideias de Platão com a superioridade da Inteligência ou Nous de Aristóteles. O Deus de Aristóteles é pensamento que pensa a si mesmo. Logo, para os medioplatônicos, esses pensamentos de Deus são eternos e imutáveis, paradigmas e regra de todas as coisas, ou seja, são as Ideias de que Platão falara. Ora, isso perpassa todos os textos gnósticos barbelo-setianos e é o fundamento dos próprios Reinos de Luz dos textos gnósticos: os aeons são pensamentos de Deus.

6 - Doutrina das Hipóstases, Hierarquização do Divino, Origem da Matéria e do Cosmo, Demonologia e outros: não vou tratar desses temas pois em relação à postagem não são de especial interesse.

Bom, o que foi exposto até aqui diz respeito àqueles textos gnósticos clássicos como Apócrifo de João mais antigos e que remontam aos séculos 1 e 2 depois de Cristo. Porém, o nosso Alógenos em análise trata-se de um texto do século 3.

Vamos lá. Se tudo o que Porfírio diz sobre Plotino e os gnósticos for verdade, então o Apocalipse de Alógeno foi escrito entre 203 e 270 depois de Cristo pois essa é a data aproximada da vida de Plotino. Para os padrões setianos é um texto tardio. Seu conteúdo revela uma ênfase na doutrina das Hipóstases que não é medioplatônica mas sim Neoplatônica e ligada aos ensinamentos de Plotino. Mas o que esse texto quer nos dizer???

Apesar de ser barbelonita, Alógenos não está interessado no Mito de Sophia, pois pressupõe que quem está lendo já conheça o mito. O texto parece ser de uma etapa superior e mais profunda na doutrina gnóstica, para quem já está familiarizado seja com gnosticismo seja com platonismo. Outros textos gnósticos deixam nas entrelinhas mas Alógenos é direto ao ponto e fala sem rodeios: existe uma técnica, uma prática ou exercício pelo qual o Ser Humano pode ter um contato direto com a Divindade e, assim, ter uma experiência Direta com Deus. O interessante do texto é que existe toda uma bela justificação filosófica para a prática antes de apresentá-la, e, depois, o autor parece querer tentar explicar o inexplicável, recorrendo justamente à Teologia Apofática para tentar mostrar ao leitor o que é Deus e qual o produto da experiência direta de autoconhecimento.

Mas vamos ao texto então.

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Comentários a Alógenos.

O texto começa explicando o que é o Ser-Triplo-Poderoso, que é também conhecida como Barbelo, o Ser Incomensurável, a eterna Luz do Conhecimento, a Juventude Virgem Masculina, a Primeira dos Aeons e outros nomes. Ela é um Ser Triplo pois é constituída de Três Aeons: Kalyptos (o aeon Oculto), Protophanes-Harmedon (Primeira-Aparição) e Autogênese (o aeon Auto-gerado). Ou seja, são três hipóstases divinas originárias: a hipóstase mais elevada de Deus é oculta tanto à nossa percepção quanto aos aeons que vieram depois dele. Depois, Kalyptos que é o aspecto Oculto emanou uma Primeira Aparição (Protophanes). Essa primeira aparição de Deus, em seguida, se auto-gerou, ou seja, começou a produzir a si mesmo, a dizer o que é Deus, o que Ele é. Se antes de tudo só havia Deus, cada hipóstase se volta para o que havia antes dela. Deus não poderia ter aparecido para outros seres antes de aparecer para si mesmo. E ele não poderia ter aparecido antes de estar oculto pois tudo o que existe, ao vir-a-ser, é precedido a algo que existe sem ser gerado e sem precisar aparecer para ninguém, ou seja, era algo oculto porém existente, existente só para si mesmo.

Assim temos:

O que estava oculto emana uma Aparição.
A aparição só pode ser aparição de si mesmo, não de outra coisa.
Logo, ao emanar a aparição de Si Mesmo, Deus começa a gerar a Si mesmo, emanando a si mesmo, se auto-gerando.

É por isso que eu sinto de pena de quem fica postando vídeos e textos dizendo "eu vou explicar o que é gnosticismo". Não vai, porque pra isso precisa primeiro ter estudado E PRATICADO de forma razoável e não-superficial o Medioplatonismo (e suas filosofias de fusão Pitagorismo e Neopitagorismo), Fílon de Alexandria e Budismo Mahayana. Se não estudou, precisa necessariamente passar pelas mesmas experiências místicas que os filósofos e místicos dessas tradições revelam em seus textos. É risível, totalmente ridículo querer entender gnosticismo sem ter tido a experiência direta da Divindade. Assim explica Alógeno:

"Pois é impossível que os indivíduos compreendam o Ser Universal localizado no lugar que é maior que a perfeição; eles podem apreender por meio de um Primeiro Pensamento - não como sendo apenas um ser, mas junto com a latência da Existência que ele confere como Ser"

O texto continua tentando descrever a Existência Incomensurável de Deus só perceptível por quem tenha passado pelas etapas da concentração nos aeons citados. A divindade feminina Youel vai mostrando a Alógeno as etapas mas sem ensinar uma prática ou método mas já pressupondo que essa percepção é em si também um tipo de prática pois é através dela que se começa a Conhecer a Deus.

"Depois ter sido captado pela Luz Eterna, fora da vestimenta que estava usando, e levado para um lugar santo, nenhuma semelhança do qual poderia ser manifestada no mundo, então, por grande bem-aventurança, contemplei todas as coisas das quais ouvira falar"

Fora da vestimenta, ou seja, fora do corpo: tendo transcendido o corpo e a matéria ele obteve uma experiência direta além do mundo material. O autor ouvira falar dessas coisas, como um crente gnóstico frequentando a igreja e estudando com os irmãos. Finalmente ele conseguiu contemplar aquelas coisas maravilhosas descritas nos textos e compartilhadas pelos irmãos: a Luz Eterna. Agora ele vai compartilhar conosco como ele fez para ter uma experiência da Luz Eterna.

"Eu me voltei para dentro, para o conhecimento das entidades do aeon Barbelo e contemplei os poderes sagrados dos luminares da virgem fêmea masculina Barbelo"

Para se conhecer Barbelo, a Grande Deusa Mãe da Totalidade, é preciso se voltar para dentro, dentro de si mesmo e se auto-observar.

"Ó Estrangeiro, contempla como tua bem aventurança reside em silêncio - uma bem-aventurança por meio da qual compreendes a ti mesmo tal como realmente és. E ao procurar compreender-te a ti mesmo, recolhe-te na Vitalidade, que verás movendo-se. E se fores incapaz de permanecer em repouso, não tenhas medo. Antes, se quiseres permanecer em repouso, recolhe-te na Realidade, e a encontrarás permanecendo em repouso e imóvel, à semelhança do que é realmente imóvel, e contém todos estes seres espirituais EM QUIETUDE E SEM ATIVIDADE"

O começo da prática é procurar um lugar adequado para que se possa permanecer imóvel, com o corpo parado. Fazendo isso, deve-se permanecer em repouso, não só corporal mas MENTAL acima de tudo. Deve-se concentrar toda a mente na Ideia da Vitalidade ou Vida. Não é para pensar ou raciocinar sobre o que é e o que não é vida, é para se RECOLHER na Vida, ou seja, concentrar mente e sentimento na Ideia de Vida. Veja, é completamente diferente de produzir pensamentos, é concentrar o pensamento na Ideia, um único ponto. Se não conseguir ficar imóvel e os pensamentos múltiplos vierem, faça o mesmo mas com a ideia da Realidade, ou seja, Existência. Concentrando-se na pura Existência e se percebendo como única e exclusivamente Existência, mente e corpo concentrados, atinge-se assim um primeiro estado de Quietude e Sem Atividade.

Ora, Quietude é a tradução em português da palavra grega Hesychia, exatamente a palavra que deu origem à prática do Hesicasmo. As origens remotas do Hesicasmo remontam aos Padres do Deserto no século IV depois de Cristo nos deserto do Egito e da Palestina. Mas a prática como está hoje só foi definida e sistematizada aos poucos, a partir do século IV com as primeiras menções a uma "quietude" e concentração em uma única frase ou palavra bíblica para depois já nos século 13 aparecerem as práticas do controle da respiração, encontrar o lugar do coração com a concentração mental, encaixe do nome de Jesus no corpo com o auxílio de visualizações e etc. A origem do Hesicasmo, portanto, obviamente está nos exercícios de concentração mental e auto-observação das Ideias Inteligíveis dentro de si mesmo desenvolvidas pelos gnósticos e não na invocação de Jesus que só foi acrescentada depois. Portanto, não tratava-se de oração. Foi transformado em oração para fugir da perseguição.

Quem quiser se aprofundar no Hesicasmo eu recomendo comprar o livro Pequena Filocalia da editora Paulus. Existe um blog dividido em dois que está traduzindo a Filocalia Grega para o português, recomendo que leiam os textos do padre do deserto Evágrio Pôntico pois são fortemente gnósticos e psicologicamente profundos, especialmente O Gnóstico que é uma obra totalmente gnóstica. O link debaixo contém os textos mais recentemente traduzidos:

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"E se receberes uma manifestação dela por meio de uma primeira manifestação do irreconhecível - do qual deves ser destituído de compreensão, se por acaso a entenderes - e aí tiveres medo, recua por causa das atividades. E se nesse lugar tu te tornares perfeito, fica imóvel; e entende também que a maneira de ele existir em todos estes seres espirituais é segundo o modelo que reside dentro de ti". 

Durante a concentração podem aparecer manifestações através de pensamentos e formas mentais - na verdade é certo que isso irá acontecer para nos distrair. Por isso é preciso recuar quando essas atividades mentais aparecerem, pois se nos deixarmos levar por elas perderemos completamente a concentração e o exercício não será realizado.

Barbelo e seus constituintes (Kalyptos, Protophanes-Harmedon e Autogênese) são uma só coisa e encontram-se dentro do Grande Si Mesmo, o Ser Triplo Poderoso. Assim nós também temos dentro de nós esses Três Poderes - Barbelo, mais que Divindade, é também um arquétipo da parte mais elevada dentro de nós, parte esta que é uma emanação de Barbelo: nós estamos dentro da Mãe (o Todo, a Totalidade) e ela está dentro de nós. Para acessá-la temos que nos concentrar e seus aspectos que já estão dentro de nós.

Bom, nas partes seguintes ele explica mais detalhes de como não se deixar levar pelos pensamentos e desejos de entender tudo sobre Deus e como permanecer na Manifestação e na Bem-Aventurança do Tríplice Poder. Depois ele conta que tentou entender com a mente e o raciocínio o Deus Inefável depois da experiência mística.

Os Luminares de Barbelo então, vendo que o Alógenos está querendo entender demais, ensinam a ele a Teologia Apofática e que na verdade Deus em Si Mesmo não pode ser conhecido nem mesmo através dos aeons Intelecto, Vida, Realidade ou Propriedade. Deus é muito além de tudo isso. Qualquer definição racional ou expressão é limitadora e rebaixadora e se perder nessas definições e racionalizações da teologia tradicional é se afastar do que Deus realmente É.

"De fato, ele não é perfeito; antes, ele é outra coisa superior. Ele não é infinito, nem limite é aplicado a ele por algum outro: antes, ele é outra coisa superior. Ele não é corpóreo nem incorpóreo. Não é grande nem pequeno. Ele não é mensurável, não é uma criatura, nem é ele alguma coisa que existe, isto é, que se possa entender. Mas antes é além disso, que é superior, isto é, que não se pode entender".

Os textos gnósticos não são os únicos do período que testemunham a prática da Concentração Mental corretamente guiada para se ter uma experiência Direta com Deus. Nós já vimos que isso existe no Medioplatonismo, no cristianismo de São Tomé e no budismo Mahayana. Encontrei exatamente as mesmas concepções do Divino em Fílon de Alexandria, no Corpus Hermeticum e nos Oráculos Caldeus.

Fílon de Alexandria, o judeu platônico, prega abertamente uma saída de si, ou seja, o abandono da própria alma ou intelecto oferecendo o corpo e a mente à Causa de todas as coisas, o que coincide com a União Mística ou Extática com Deus. É justamente ao se anular completamente ofertando nossos corpos a Ele que Ele se dá a nós e nos possui. Ele diz claramente em Quis Rerum Divinarum Heres (Sobre Quem é o Herdeiro das Coisas Divinas):

69. Si, pues, oh alma, algún deseo te sobreviniere de heredar los Divinos bienes, no sólo has de dejar "tu tierra", o sea, el cuerpo, "tu familia", es decir, la sensibilidad, y "la casa paterna", esto es, la palabra; sino también has de huir de ti misma y situarte fuera de ti, transportada e inspirada con cierto profético frenesí al modo de los poseídos y coribantes.

70. Porque esta herencia pertenece a la inteligencia que experimenta ese Divino arrebato y no está ya en sí misma sino se halla fuertemente impulsada, enloquecida por un celestial amor, conducida por el Que realmente Existe y arrebatada hacia Él en las alturas, guiada por la verdad, que remueve todo obstáculo de su camino para que avance sin tropiezos por él.

Mais adiante no mesmo livro:

263. Admirablemente, pues, describe el legislador al inspirado cuando dice: "Hacia la puesta del sol sobrevínole un éxtasis". Llama simbólicamente sol a nuestra inteligencia; porque lo que el raciocinio es en nosotros, eso es el sol en el mundo como que uno y otro son portadores de luz; el uno, arrojando claridad sensible en el universo; el otro, lanzando rayos de luz intelectual sobre nosotros mismos a través de las aprehensiones.

264. Así, mientras la inteligencia nuestra gira en torno a nosotros y esparce su luz derramando una como meridiana claridad sobre el alma toda, somos dueños de nosotros mismos y no somos poseídos. Mas, cuando ella llega a su ocaso, nos sobreviene, como es de esperar, un éxtasis y la Divina posesión y locura, ya que, cuando la luz Divina ilumina, ocúltase la humana; y, cuando aquélla se oculta, ésta surge y se eleva.

265. Esto sucede habitualmente a la estirpe de los profetas. Con la llegada del Divino espíritu, apártase la inteligencia nuestra; y, cuando aquél se marcha, ésta retorna nuevamente, porque no es lícito que lo mortal cohabite con lo inmortal. Por eso el ocaso de la razón y la obscuridad en tomo de ella engendra un éxtasis y una locura inspirada por Dios

Ele diz também em De Somnis (Sobre os Sonhos enviados por Deus) que o Conhecimento de Si Mesmo leva ao Conhecimento de Deus:

60. Entre éstos se cuenta Abraham, quien realizó progresos y avances en orden a la
adquisición de un saber más elevado. En efecto, cuando se hubo conocido a sí mismo al máximo, entonces en igual grado se desprendió de sí mismo a fin de llegar a un exacto conocimiento del Que verdaderamente Es. Y es natural que así fuese: aquel que se ha comprendido suficientemente a sí mismo, se desprende suficientemente de sí al darse claramente cuenta de la insignificancia de las creaturas en todos los aspectos; y quien se desprende de sí mismo conoce al Que Es.

No Corpus Hermeticum isso é praxe, são abundantes e sem fim as referências à técnicas de concentração mental para se obter o conhecimento direto de Deus. É particularmente espetacular essa passagem do Discurso Secreto Sobre a Montanha Relativo à Regeneração e à Regra do Silêncio:


"3 - Tu me dás, ó pai, explicações impossíveis e forçadas, é esta a razão pela qual farei uma justa réplica: "Nasci como um filho estrangeiro à raça de meu pai." Não me recuse ciumentamente tua ciência, pai, sou teu filho legítimo: expõe-me completamente o modo de regeneração. 

- Que direi, meu filho? nada mais posso dizer que isto: em mim mesmo uma visão imaterial, produzida pela misericórdia de Deus, sai de mim mesmo para entrar em um corpo imortal e não sou mais agora do que era mas fui engendrado no Intelecto. Esta coisa não pode ser ensinada e não pode ser vista com este elemento formado de matéria, formado para que através do mesmo possa se ver aqui embaixo. Eis também por que não me preocupo desta primeira forma composta que foi a minha. Não percebo mais as cores, nem o sentido do tato, nem medida no espaço, tudo isto me é estranho. Agora me vês, meu filho, com os olhos, mas o que sou não podes compreender olhando-me com os olhos do corpo e pela visão sensível, não são com estes olhos que posso ser visto agora, meu filho". 



E nos Oráculos Caldeus também o Conhecimento da Tríade Divina que é comandada por uma Mônada é inalcançável pelos métodos da filosofia tradicional, devendo sim o Teurgo fazer o vazio dentro de si, esvaziando a Alma dos conteúdos do intelecto e dos pensamentos sensíveis: Dizem os Oráculos Caldeus em seu fragmento 1:



"Existe um certo inteligível que deves conceber como o mais fino intelecto; porque se o teu intelecto se dirige a ele e tentas concebê-lo como se concebesse um objeto determinado, tu não o conceberás; pois ele é a força de uma espada luminosa que brilha com talhos intelectivos. Não se deve, pois, conceber esse inteligível com veemência, mas graças à chama sutil de um sutil intelecto, que mede todas as coisas, exceto esse inteligível; e não se deve concebê-lo com intensidade, mas, voltando para ele o olhar da tua alma separada do sensível, lançar para o Inteligível um intelecto vazio do pensamento, para aprender a conhecer o Inteligível, dado que subsiste fora das apreensões do intelecto humano". 





CONCLUSÃO



Dado que Alógenes é no mínimo 100 anos anterior ao surgimento dos Arcônticos, é perfeitamente possível que Eutactos de Satala e o monge Pedro Gnóstico possuíam consigo cópias de Alógenes e que esse, pelo seu conteúdo barbelonita, seja o mesmo Allogenes (Estrangeiros) que Epifânio diz ser Escritura da Igreja Arcôntica.

Dos Padres do Deserto, os exercícios hesicastas chegaram ao Ocidente, ou seja, Roma através de João Cassiano, o fundador do monasticismo ocidental. Aqui, dentro dos mosteiros católico-romanos, formas modificadas de hesicasmo continuaram existindo "secretamente", longe da grande massa dos fiéis e dos padres. Relativamente recente chegou ao público católico a prática da Oração Centrante (Oração Monológica), bem como a Lectio Divina, principalmente pela redescoberta do texto católico Nuvem do Não-Saber.

Já Tereza de Ávila e João da Cruz foram mais influenciados pelo gnosticismo mitológico de Sophia e pela concentração interior dos Apócrifos, fontes tanto do Castelo Interior de Tereza quanto da Noite Escura da Alma de João da Cruz.

Uma coisa interessante são os Exercícios Espirituais de Inácio de Loyola. Eles são quase que versões simplificadas de exercícios e práticas preparatórias básicas para formas de Yoga do Budismo Tibetano.





COMENTÁRIO EXTRA



É realmente lamentável que pessoas preguiçosas e covardes venham atacando o gnosticismo com tudo quanto é mentira, maledicências, truques e manipulações ridículas do passado sem ter a mínima coragem de pesquisar nos próprios textos reencontrados o que é que o povo gnóstico prega. Imagine se para conhecer o catolicismo eu fosse estudar o que os calvinistas, luteranos, muçulmanos dizem sobre, e não fosse estudar os próprios autores católicos? Que pesquisa mais sem noção não é? Agora porque os detratores da gnose fazem o mesmo, apenas pegando aqueles que inventam mentiras e nos atacam? Quem disse que Hans Jonas, Eric Voegelin, Padres da Igreja, Youtubers, católicos leigos ou sei lá mais que tipo de pessoas covardes entendem de gnosticismo, se não leem os textos, não vivem e nem experimentam as práticas e concepções filosóficas e espirituais gnósticas??? NÃO SABEM NADA E TUDO O QUE ELES DIZEM É ABSOLUTAMENTE FALSO!


Causa revolta e indignação e eu fico tentado a sentir muita alegria e prazer ao ver a Esquerda, a Globo, o PT, a Folha de São Paulo e outros se levantando contra essa turminha do Olavo de Carvalho e seus alunos, padres, pastores e youtubers capengas com todo tipo de artimanhas, truques e manipulações para destruir a imagem deles. Pois seus antepassados fizeram conosco isso, e muito pior pois nos queimaram nas fogueiras e destruíram nossos livros. Não sei do que os "conservadores" estão reclamando se tudo o que eles acusam de sofrer da "mídia esquerdista" eles continuam fazendo conosco. O que um texto como Alógenes tem a ver com marxismo, fascismo, nazismo e movimento revolucionário???? SÓ QUEM NÃO LEU PODE ACHAR QUE OS TEXTOS GNÓSTICOS TEM ALGO A VER COM ISSO, É INACREDITÁVEL!!! DISTÚRBIO MENTAL GRAVÍSSIMO!

É realmente bem feito que a esquerda aja dessa maneira com essas pessoas pois elas continuam dizendo que os cátaros querem matar todas as pessoas e eram abortistas suicidas; que nós somos deprimidos desesperados que queremos destruir o mundo e criar outro utópico; que nós dizemos que Deus é mau; que nossa religião é a fonte do marxismo, fascismo, nazismo e etc. Tudo isso são calúnias, injúrias e difamações contra nossa Fé inventadas por pesquisadores doentes e mentirosos que veem um suposto "gnosticismo" em tudo e todo lugar como se fosse um fantasma que os persegue. Em verdade a Partícula de Luz deles está apagada devido a tanta ignorância e o demente Yaldabaoth os cega para que achem que seus parcos e falidos conhecimentos mundanos são a Verdade.

Nossos adeptos do mundo inteiro, da China ao Irã, dos Estados Unidos ao Japão, são pessoas boas que estão buscando melhorar cada vez mais seus talentos e despertar mais virtudes se desvencilhando da escravidão do corpo e da matéria, se esforçando em serem pessoas melhores para suas famílias, comunidades e localidades. É muita covardia o que fazem conosco perpetuando essas mentiras ridículas e facilmente refutáveis, bastando ler qualquer texto nosso. E quanto mais nos atacam, mais a esquerda baixa o nível contra eles, pois o nível deles contra nós já é baixo e vil - nada que eles já não estejam a par pois são exímios praticantes do mal.

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